Especialistas apontam que brincar de faz de conta pode ajudar a formar adultos mais críticos e menos suscetíveis à idolatria política
Durante a infância, muitos pais se preocupam quando os filhos criam amigos imaginários. No entanto, segundo psicólogos e pedagogos, essa prática não só é saudável como pode ser essencial para o desenvolvimento da autonomia crítica na fase adulta. Estudos indicam que a capacidade de imaginar e criar cenários alternativos é uma base importante para evitar comportamentos como a idolatria cega de políticos — fenômeno cada vez mais comum e preocupante na sociedade brasileira.
Imaginar na infância ajuda a pensar por conta própria
A presença de um amigo imaginário costuma aparecer entre os 3 e 8 anos, fase em que a criança experimenta o mundo simbólico. De acordo com a psicóloga americana Marjorie Taylor, referência mundial no estudo da imaginação infantil, esse tipo de brincadeira está ligado ao fortalecimento da empatia, da resolução de conflitos e do pensamento independente.
No Brasil, especialistas como Lúcia Rabello de Castro, da UFRJ, reforçam que o faz de conta estimula o cérebro a considerar possibilidades além da realidade imediata. Isso significa que, no futuro, o indivíduo será mais capaz de questionar discursos prontos, inclusive os de líderes políticos.
Essa habilidade, chamada de pensamento divergente, é uma das principais defesas contra a formação de “políticos de estimação” — termo popular que se refere à idolatria acrítica por figuras públicas, ignorando falhas e contradições.
Idolatria política: um sintoma da falta de pensamento crítico
A sociedade brasileira tem vivido uma crescente polarização, marcada por discursos apaixonados e reações viscerais. Segundo uma pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada em 2023, 64% dos brasileiros admitem defender políticos mesmo diante de denúncias ou erros claros.
Especialistas acreditam que esse comportamento está enraizado na dificuldade de reconhecer a complexidade dos acontecimentos. Quando não se desenvolve o hábito de questionar e imaginar alternativas desde cedo, o adulto tende a buscar figuras que representem certezas absolutas — mesmo que ilusórias.
A infância, portanto, é um terreno fértil para plantar a capacidade de pensar com autonomia. Crianças que tiveram liberdade para criar seus próprios mundos e interagir com personagens invisíveis são, frequentemente, os adultos que se recusam a seguir cegamente qualquer líder.